Aula sobre a Guerra da Bósnia a partir de canções de guerra
Estratégias de ensino-aprendizagem
Nesta proposta de aula sobre a Guerra da Bósnia, o professor de história pode encontrar uma dica interessante de como conduzir o assunto em sala.
A Guerra da Bósnia foi um conflito que aconteceu na Bósnia entre 1992 e 1995 durante o processo de fragmentação da antiga Iugoslávia. Desse processo de fragmentação, surgiram sete novos países: Croácia, Bósnia-Herzegovina, Sérvia, Montenegro, Eslovênia, Macedônia e Kosovo (possui reconhecimento internacional de maneira parcial).
O processo de independência da Bósnia foi o mais complexo de todas as nações iugoslavas em virtude da grande diversidade étnica existente no país. As etnias majoritárias da Iugoslávia no começo da década de 1990 eram bósnios, croatas e sérvios. Cada uma dessas etnias defendia interesses diferentes em relação ao futuro da Bósnia.
Quando a Bósnia declarou sua independência, forças dissidentes de origem sérvia declararam guerra e iniciaram um conflito que se estendeu por três anos e matou cerca de 100 mil pessoas. Durante o conflito, crimes de guerra foram cometidos por todos as partes envolvidas, entretanto, atribui-se aos sérvios a maior quantidade de crimes de guerra cometidos, principalmente genocídios.
A guerra foi resultado, principalmente, das rivalidades históricas existentes entre as etnias majoritárias que compunham a região. Durante o conflito, foi muito comum a utilização de canções de guerra, que, além de atuarem como propaganda, também serviam para aumentar o moral das milícias.
As canções sérvias produzidas durante a guerra possuíam um forte caráter nacionalista e xenofóbico e, portanto, contribuíram para a promoção do nacionalismo, sobretudo sérvio, e para a manutenção do ódio étnico contra croatas e bósnios. A maioria das canções foi produzida no estilo “turbo-folk”, um estilo muito comum entre os sérvios na década de 1990 que misturava música tradicional sérvia com elementos de música pop. Alguns dos nomes de destaque na produção de turbo-folk durante a guerra foram Rodoljub Roki Vulović e Miro Semberac.
A intenção da proposta, professor, não é simplesmente ouvir a música, mas entender o contexto no qual ela está inserida e a interpretação da letra. É importante que o aluno entenda a mensagem xenofóbica que está por trás da maioria das letras para a partir daí realizar a crítica da mensagem trazida pelas canções. Veja dois exemplos de músicas de guerra produzidas durante a guerra da Bósnia.
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Generale, generale – Roki Vulović
Essa música produzida por Roki Vulović, um dos maiores – senão o maior – cantores na produção de músicas de guerra, faz uma homenagem ao general sérvio Ratko Mladić. O general Mladić foi o comandante-geral das tropas bósnio-sérvias que lutaram contra os bosníacos (bósnio-muçulmanos) e o responsável direto pelo cerco à cidade de Sarajevo, que durou quase quatro anos. O cerco a Sarajevo iniciou-se quando tropas sérvias fecharam as saídas da cidade de Sarajevo e posicionaram artilharia pesada e franco-atiradores nos morros ao redor da cidade. Além disso, durante o cerco, Ratko Mladić ordenou o corte de energia e água da cidade, autorizou os bombardeios da artilharia sobre a capital Bósnia e deu autorização aos franco-atiradores para atirarem indiscriminadamente em alvos civis, inclusive crianças.
Além do cerco a Sarajevo, Ratko Mladić liderou pessoalmente o ataque a Srebrenica, que resultou na morte de 8 mil bosníacos, que foram enterrados em valas comuns. Atualmente o massacre de Srebrenica é considerado um dos maiores crimes de guerra da Guerra da Bósnia.
Após a guerra, o general Ratko Mladić foi considerado criminoso de guerra. Esteve desaparecido durante muitos anos e foi preso em 2011.
Para melhor compreensão, segue a tradução da música:
Far from the forested vietnamese mountains General, general! Far from the desert sand dunes You were not asleep when the sun rose |
Longe das florestas das montanhas vietnamitas General, general! Longe das dunas desérticas Você não estava adormecido quando o sol nasceu |
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Dzamije Lete [Todos os mosteiros serão explodidos] - Miro Semberac
Essa música, também conhecida como “Jadna Bosno Suverena” (Pobre Bósnia Independente), é cantada por Miro Semberac e manifesta claramente a animosidade sérvia contra os bósnios. A música, em determinado momento, fala na “vingança sérvia”, e isso deve ser entendido dentro do contexto da não aceitação da proclamação da independência da Bósnia e dentro de acontecimentos que podem remeter aos conflitos durante a Segunda Guerra Mundial, quando os bósnios aliaram-se aos croatas do Ustaše.
Os sérvios defendiam a anexação dos territórios bósnios à Sérvia, o que motivou o início da guerra. A música também se refere à destruição da Bósnia como consequência da declaração de independência. Aqui, professor, pode ser trabalhado, sobretudo, a questão da xenofobia, que foi fundamental para as primeiras agressões realizadas pela Sérvia em 1992 e um precedente para os genocídios cometidos durante a guerra.
Para melhor compreensão, segue a tradução da música:
Alas poor independant Bosnia It is time for the serbian revenge It is pointless to follow the ramadan's fast Alija, you will not get away like before |
Pobrezinha Bósnia independente É a hora da vingança sérvia Não há sentido seguir o jejum do Ramadã Alija, você não fugirá como antes |
*Alija Izetbegovic era o presidente da Bósnia-Herzegovina e representante da população bosníaca;
**Ante Pavelic era um nacionalista croata que liderou a Croácia fascista com os bósnios durante a Segunda Guerra. Azem Galica foi um nacionalista kosovar que lutou contra a formação da Iugoslávia em 1918. Josip Broz Tito foi o líder da Iugoslávia socialista até sua morte em 1980.
***Dimije é uma calça típica dos turcos. O dimije para os bosníacos era um símbolo coletivo que representava o Islã e sua cultura.
Observações importantes:
É importante considerar que a utilização das canções em sala de aula deve ser realizada após uma ou mais aulas de contextualização histórica do conflito e das rivalidades étnicas. Caso seja necessário, professor, faça uma abordagem das rivalidades étnicas com base no que aconteceu na Segunda Guerra Mundial, quando chetniks (sérvios monarquistas) lutaram, em geral, contra croatas fascistas e bósnios que aderiram à causa croata. Para saber mais sobre o tema, leia: Segunda Guerra Mundial na Iugoslávia.
Por Daniel Neves
Graduado em História